Perguntas sobre Sanatana Dharma :: 1::
"O Que É Varna-Ashrama"?
"O Que É Varna-Ashrama"?
Swami Krsnapriyananda Saraswati
Sou jornalista ... Busco informações sobre o hinduísmo no Brasil. Gostaria de saber quantos sacerdotes hindus existem no país. Além dos sacerdotes, outros praticantes do hinduísmo fazem voto (formal) de celibato? Estou fazendo um infográfico com dados demográficos brasileiros, número de pessoas casadas, solteiras, viúvas etc. Nele também apresento informações gerais sobre as religiões no Brasil em que o líderes espirituais não se casam para se dedicarem a vida espiritual".
Sobre suas perguntas, considere que o ethos da Índia é muito diferente do Ocidental. "Hinduísmo" não é uma religião, talvez seja milhares ou milhões; também "hinduísmo" é um termo equívoco, como chamar os estrangeiros de "gringos". Por conseguinte, desconhecemos o número de adeptos de algumas entre as milhares denominações do Sanatana Dharma espalhadas pelo mundo, e no Brasil, as quais estão concentradas na Índia. São dados de difícil apuração. Com relação ao "celibato", isso é distinto da tradição judaico-cristã. Há o chamado varna-asrama, que no Ocidente ficou conhecido e mal interpretado como "sistema de castas". Mas este, originalmente, se refere a ocupação ou atividade de alguém e à posição que se encontra dentro da vida espiritual, entendendo que há uma relação entre as diversas fases da vida (de acordo com o envelhecimento do corpo material), e a posição em que o individuo se encontra. Diferente das tradições judaico-cristãs, TODOS os membros ou devotos são considerados monges. Portanto, há monges casados, solteiros, viuvos e também renunciantes. isso quer dizer que não há uma clara separação entre adeptos e sacerdotes, porque os adeptos são também sacerdotes, tendo funções distintas de acordo com a posição de varna-asrama. O Varna asrama é mais complexo e ao mesmo tempo mais simples do que o sistema estanque, oligárquico, e centralizador das tradições religiosas institucionais do Ocidente. O chamado "hinduísmo" não é uma religião e nunca será; se um dia passar a ser, conseqüentemente deixará de existir, portanto, o Sanatana Dharma é uma Filosofia Perene, que está além de religiões ou denominações religiosas; é um eterno renunciar de "eu" e "meu", portanto, "minha religião", "meu deus", e coisas do gênero não pertencem ao Sanatana Dharma. É necessário um afastamento da interpretação ou leitura das características das religiões institucionais do Ocidente para poder entender e compreender o Sanatana Dharma. Na medida em que o Supremo ou Brahman tem milhares de nomes e ou formas, Ele está presente em tudo e em todos. Por isso a instrução contida no Bhagavad-gita 18.66, "sarva dharmam mam ekam", "abandone obrigações religiosas e adore-Me" é de suprema sabedoria. Temos então que iniciar falando sobre Varna e Asrhama:
1. O Que é Varnashrama?
O sistema de Varna e Ashrama, posição da etapa de ação ou Karma na vida, e posição na situação como “devoto”, é um sistema que foi criado diretamente pela Suprema Personalidade Divina, dito no Bhagavad-gita 4,13:
catur-varnyam maya sañtam
guna-karma-vibhagashah
tasya kartaram api mam
viddhy akartaram avyayam
Vemos com clareza, no verso acima, que Varna-Ashrama não se trata de uma criação humana, ou de uma simples especulação política ou econômica; o fato de o Varna ter uma relação direta com a atividade ou Karma, de uma pessoa, ou de um grupo social, não lhe dá uma condição de fatalismo. Por razões que se desconhece os porquês, mas podemos deduzir face aos eventos culturais do Ocidente, quando nos aproximamos desta idéia filosófico-prática do Sanatana-dharma, vemos que a palavra “karma” foi mal traduzida, tendo interpretações como sendo “algum tipo de punição”. Contudo, Karma diz respeito à atividade; profissão; ação mediada pelo dever ou dever-ser, etc., que alguém realiza durante uma certa etapa natural da existência corpórea, bem como naquela em que a pessoa se engaja para garantir o seu sustento. Neste sentido objetivo, todos nascemos Shudras, ou seja, somos dependentes inteiramente de nossos pais para nossa sobrevivência. De fato, são muito poucos os seres vivos que precisam de tanta atenção dos pais como os primatas humanos. Não menos do que 4 ou até 6 anos são necessários de absoluto atendimento e cuidado, principalmente por parte da mãe, para com a criança. Até que uma pessoas possa determinar-se no mundo, por sua própria conta, ela deverá passar, de modo inevitável, por todo o Varna. Isso quer dizer que por ¼ das nossas vidas somos Shudras, porque precisamos, no mais das vezes, e nas condições naturais, da absoluta ajuda dos pais ou substitutos. Depois, quando a pessoa ingressa na etapa de casado ou de atividade doméstica, ela ingressa na chamada fase de Vaishiya, ou seja, detém algum tipo de atividade para a sua subsistência; depois de atinge uma certa maturidade do que faz, bem como experiência de vida, uma pessoa ingressa naturalmente no Varna de Kshatriya, e passa a administrar, gerenciar e coordenar os outros mais jovens, e, por fim, quando uma pessoa atinge a velhice, ela passa a ocupar o cargo de conselheiro ou orientador das pessoas que estão nas outras classes, sendo, bem por isso, chamado de sábio ou Brahmana. Conjuntamente com o desenvolvimento natural da pessoa na sociedade, há o desenvolvimento ou situação ou etapa da chamada “vida espiritual”. Isso quer dizer que uma pessoa pode seguir a vida de relação e desenvolvimento social, de modo perfeito, uma vez que siga os preceitos ou pilares do Artha, Kama, Dharma. Assim ela poderá esperar por um bom nascimento, e ser agraciada com uma vida melhor num próximo nascimento. Contudo, se ela desejar liberar-se do Samsara, ou deste ciclo ou Chakra de nascimentos e mortes, que se intercalam em “bons” e “ruins”, segundo a reação acumulada de cada um, então há o Moksha, que deverá ser trilhado pelo Ashrama, ou posição ou situação na vida devocional. Por conseguinte A “ashrama” tem a ver com a etapa da vida espiritual. Neste caso, a pessoa deverá ser educada numa escola, ou Gurukula. Desta forma, por volta dos 5 anos de idade, enquanto Shudra, o aluno ingressa na ordem de Brahamacharia, o estudante celibatário, ou seja, solteiro, passando o Guru ou preceptor espiritual a ocupar o lugar dos pais na manutenção da vida da pessoa. Depois, por volta dos 20 anos, mais ou menos, a aluno devoto está pronto para ingressar no Varna de Vaishya, podendo, então, se quiser, ingressar na ordem de vida de Grihasta ou de chefe-de-família, ou seja, se possui tendência para a vida de casado, deverá assumir a responsabilidade econômica de um lar, e assim deverá permanecer até que o seu filho mais velho (se não tiver filho, a própria idade cronológica estabelece), assuma a responsabilidade de manutenção da mãe. Uma vez afastado da vida familiar, pelo processo natural que ocorre por volta dos 50-60 anos, a pessoa ingressa na ordem de vida denominada de Vanaprashta, ou de retirado (equivaleria ao aposentado), e junto com a esposa, se esta quiser, afastam-se para a floresta, a fim de reavaliar a nova etapa da vida que se aproxima, a de pregador itinerante ou Sannyasi. O ingresso na ordem de vida de renunciado ou Sannyasa dá-se depois de uma espécie de “relembrança” da fase de Brahacharya, onde os livros são relidos, alguns são lidos especialmente nesta época, etc. O ingresso na ordem de vida de Sannyasa, bem como todas as outras etapas, passo a passo, é antecedido de uma cerimônia, que leva o nome genérico de Samskara. Sannyasa Samskara é quando o sujeito ingressa formalmente na ordem de Sannyasa, e passa a viajar, pregando e vivendo de esmolas.
Este é o processo clássico de Varna e Ashrama – Varnashrama – mas que com o tempo se politizou, passando a dar o sentido político ou de nascimento, o que não é válido pelo ponto de vista das Escrituras originais.
Apesar do ciclo natural do Varna-ashrama, pode-se encurtar etapas. No caso, um devoto pode querer permanecer na ordem de Brahmacharya e passar direto para a ordem de Sannyasa. Neste caso, ele será considerado um Naistika Brahmachary (quem nunca se casou).
Este é o sentido original do Varna e Ashrama, segundo as Escrituras originais ou Vedas.
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