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sábado, 9 de outubro de 2010

Os Kali-chelas


Swami Krishnapriyananda Saraswati


Kamsa joga Subhadra ao solo, mas Ela se transforma em DURGA

Medo e imobilismos são características da ignorância. Tanto um como outro fator são produtos da denominação e da imposição de uns sobre outros. Aqueles que impõem o imobilismo e a dissolução da vontade costumam dizer que pensar diferente da massa hegemônica é insalubre. Desta maneira, a massa é subjugada pela vontade de uns poucos, que no mais das vezes se locupletam, como resultado direto do medo e do imobilismo dos outros.

A Filosofia Perene – Sanatana Dharma – diz claramente que a ignorância é motivo do Samsara ou “eterno retorno”, e com todas as claras letras Sri Krsna relembra para Arjuna, no Bhagavad-gita, que ele deve apoderar-se de si mesmo, largando as ideias de falso ego (eu e meu). No verso 18.63 daquele poema épico nós temos:

iti te jñanam akhyatam guhyad guhyataram maya |
vimrsyaitad asesena yathecchasi tatha kuru
|| 18.63
Assim, eu expliquei para ti o mais secreto dos conhecimentos. Após refletir plenamente sobre isto, faça o que desejares”.

Observemos que o verso está no final do texto. Anteriormente fora relembrado para Arjuna todos os aspectos relativos à razão da existência humana, e o propósito do nascimento, vida e morte. Quem somos? de onde viemos? e para onde vamos?, depois de aqui na Terra, é tratado no Bhagavad-gita. Portanto, um conhecimento muito transcendental foi tocado no Gita até aqui neste verso conclusivo. Krsna assumiu o papel de “rememorar” o esquecido e lamentoso Arjuna. O gita é um memendo de instruções transcendentais. Krsna tinha o guerreiro em Suas mãos, devido a situação de desespero da identificação objetiva que o assolou em dúvidas. Mas o verso do gita acima nos mostra a perfeita relação entre mestre e discípulo. Krsna não disse “larga tudo o que você sabe ou faz e simplesmente cumpra o que digo ou Me segue!”. Jamais Sri Krsna limitaria o livre arbítrio e a vontade livre de qualquer ser. Ele é o Ser Supremo personificado, e com certeza nos quer livre e em abundância. Isso é uma diferença notável das crenças e “ismos” da modernidade, que tão somente têm em vista achatar, aniquilar, acabar com quaisquer possibilidade de relação intima e livre de alguém com Deus; isso é um contraste definitivo com o Sanatana Dharma. Na atual era, o Transcendente e o Divino virou um produto, apenas um resultado simplista da lei da oferta e procura, promovendo o imobilismo espiritual, na tola crença que ninguém precisa fazer mais nada a não ser dar dinheiro para os líderes das religiões das quais desesperadamente recorrem, sem saber que com eles perdem a liberdade de amar e ser livre com Deus. O "deus" das modernas religiões de tradição hebraico-cristã já morreu faz tempo, e apesar de ainda feder não o enterraram (bem já o dizia Nietzsche), como já está nas antigas religiões do alvorecer da Kali-yuga (cerca de 5 mil anos atrás).

A era de kali-yuga não é apenas uma era de hipocrisias, mas de aniquilação e imobilismos da liberdade. Aniquilação do verdadeiro brilho que alguém realmente é para o mundo, independente de sua posição de nascimento, casta, raça, credo, crença ou religião. Por todos os recantos do mundo se infiltra a escuridão da ignorância e dissolução do Ser ou do Si mesmo. Se perguntarmos para alguém sobre Deus ou o Divino, seu discurso será tão previsível como uma propaganda de maionese na televisão. O tolo adepto desta ou daquela religião kalichela repete slogans, porque não sabe raciocinar por si mesmo. Deus está tão longe dele e de seus temores que não consegue perceber a sua própria divindade e meta divina no mundo. Formou-se um dualismo sujeito-objeto, onde o objeto material é o principal objeto de desejo a ser alcançado. Mas o pó irá comer o seu imobilismo; alguém irá enriquecer da sua dissolução.

É interessante também observar que na kali-yuga há grupos de intelectuais que leem e estudam de tudo sem que este “tudo” consiga penetrar além do pó do imobilismo de suas crenças em que estão presos e nem sequer sabem que se debatem nele. No pó patinam sem dar um passo adiante, assim como um besouro não consegue caminhar de barriga para cima, e tolamente se vangloriam em dizer que alcançaram a verdade, bastando dar um pouco de dinheiro para a “igreja” a qual creem ser a única tola morada de Deus. São tolos repetindo slogans e mitos criados por alguém muito esperto em marketing. Bons exemplos para publicitários. Nesta era de hipocrisias, tudo ficou fora da pessoa; Deus “mora no templo”, o qual tem dono e cobra taxas para alguém poder participar, e a morte “mora no cemitério”, que também tem dono e cobra para alguém poder ali colocar seu cadáver. É difícil viver, é difícil morrer. Paga-se para viver, paga-se para morrer. Observe-se que ninguém morre e ninguém precisa de Deus em casa!? Quando alguém sai na semana dos mortos diz, “vou ver fulano ou ciclano”; vai ao cemitério, ao qual paga taxas e alugueis; mas nem fulano nem ciclano estão mais lá. Ficaram somente ossos e pó; os ossos do imobilismo, e o pó da dissolução,  da maravilha que é a vida, a qual perderem sem refletir, sem viver de verdade.

O eterno retorno
“Nunca houve um tempo em que Eu e você, amado Arjuna,não tenhamos existido, mas Eu me lembro de tudo, você não”. Assim diz Krsna no cap. 2 do Gita. O tempo é eterno e sempre existente; é uma categoria pura da razão, como diz Kant, e sua rota é cíclica; o ciclo das eras se repete, e o vício dos homens em querer dominar a Terra e os outros também. Não há tempo linear. Observe-se o que acontece com aqueles povos os quais são produtos do imobilismo e a dissolução. Quem não é ensinado a pensar apenas “dá a pata” para quem o alimenta com pão e circo. Os poucos que dominam os muitos, se locupletam e engordam seus desejos luxuriosos com falsas promessas. Se alguém, por outro lado, se esforça para ocupar o cargo de outro que já vem a tempos engordando seus lucros, ele acaba fazendo o mesmo consigo, e assim simplesmente troca o vaso por sobre o mesmo pedestal do egoísmo pessoal e imobilismo e dissolução social. Assim na kali-yuga alternam-se governos; os  líderes religiosos, e toda a catrefa de patifes kalichelas. Raramente alguém convida um outro a pensar, a participar. Apenas repetem-se slogans e jargões. Enquanto se entretêm a massa com promessas de ninharias, grupos pensam como mantê-la sob o jugo do imobilismo e dissolução; “tudo para manter a barriga”, diz Sankara.

Krsna, ainda adolescente, mata Kamsa
Kali-yuga tem esta característica dentro dela também. O mais notável que a era de kali-yuga nos permite ver em pouco tempo coisas que levavam muitos anos para acontecer. De um dia para o outro vemos os patifes e suas patifarias às claras. Mas assim como as patifarias, roubos, desvios, crimes contra a honra e a moralidade, aparecem na mídia, logo desaparecem no esquecimento da memória da massa. Afinal a massa apenas vive de pão e circo da imediatidade; não tem escatologia. O drama da vida fica superado pela promessa que promove o imobilismo e a dissolução aqui e agora. Quando alguém se levanta para mostrar que há algo errado em deixar os “gatos cuidar do guisado”, se renova os créditos de pão e circo; surgem bolsas, bolsinhas e bolsões; dá-lhe pão no circo! Ninguém mais se preocupa em laborar seu próprio karma; alguém, um “salvador”, já o fará por ele bem ligeiro. Dá-lhe pão no circo! Isso é o imobilismo e dissolução como instrumento de dominação da massa. Assim era na época de Kamsa, o governo demônio que explorava o povo no seu imobilismo e dissolução; um pouco de pão, um pouco de circo, então todos ficavam a mercê da vontade do seu governo. Kamsa jamais distribui a riqueza que acumulava nas suas falcatruas, a não ser com seus filhos e parentes mais próximos, e que não estavam contra ele. Kamsa colocou a liberdade no cárcere. Ele prendeu Devaki e Vasudeva, pais de Krsna num porão. Cada um dos filhos que nascia do casal era morto por ele de forma brutal. Kamsa não queria que ninguém pensasse além dele e sua corja de malandros, e tinha escutado que o oitavo filho de Devaki iria matá-lO. “Oitavo” significa que a roda do tempo daria uma volta inteira. O tempo é cíclico. Kamsa colocou até mesmo seu pai, Ugrasena, a ferros porque este distribuía a riqueza com a massa, e os incentivava a viver livres para amar a Deus. Kamsa encheu seu palácio com seus cupinchas e aliados. Promovia festas, orgias, comilanças, beberagens. Dias e noites as luzes dos seu palácio brilhavam ao som de músicas as quais embalavam os visitantes bêbados. As despensas estavam cheias de comida e produtos importados de todas as partes do mundo. Assavam um camelo inteiro, por dias, tendo no seu interior um bezerro recheado com cordeiro... Quando alguém pensava em reclamar do barulho, de pronto silenciavam-no. Não havia espaço para a liberdade de expressão. Ninguém podia dizer algo contra, porque na calada da noite os impostos subiam, os quadrilheiros os matavam. Ninguém escapava da tirania luxuriosa insaciável de Kamsa. Todos sabiam dos roubos e desvios dos associados íntimos de Kamsa, mas somente ele não via nada, porque afinal de contas ele sempre se beneficiava no final. Assim era o governo do Kamsa, construído por sobre o seu egoísmo luxurioso, embasado na sua atuação que pregava o imobilismo e a dissolução, propagando a falsa liberdade e progresso. Estava decretado o fim da liberdade de ser. Tal Kamsa tal câncer social; interessante relação!

A Verdade liberta
Krsna não somente acabou com a luxuria imobilizante de Kamsa, como libertou-nos a todos para podermos livremente amá-lO, sem nenhum tipo de intermediário, nem governos, nem nada, entre nós e Sua imensa misericórdia. Ele é a Verdade personificada. Ele nos mostrou que ninguém escapa das garras da morte, e que aqueles os quais ficaram suas vidas tolamente controlando e enganando a dos outros, irão lastimar profundamente na hora derradeira, porque nada os poderá salvar do próprio egoísmo ao qual estão atados há  milhares de vidas. Assim como um torniquete estrangula quem o aperta, assim também se estrangulam nos seus egoísmos, no carregar o triste destino que os levará diante de si mesmos a perceberem suas tiranias.

Todo aquele que estiver equipado com as palavras libertadoras relembradas por Krsna no Bhagavad-gita saberá perfeitamente distinguir o joio do trigo. Será liberto da tirania dos falsos lideres, sejam políticos mundanos ou políticos religiosos; seja de governos, seja de falsos religiosos. Mas para compreender isso nem precisa ler o gita, basta observar a seguinte regra: “quem não pensa por si mesmo, engorda aquele que faz pensar por ele; tomara seja honesto!?”; não tem dúvida, abrace o conhecimento, ou a gordura do teu corpo será adubo para a tola conta corrente de kalichelas.

Hari hara om tat Sat

Glossário
Kali-chela: servidores de Kali-yuga 
Sanatana Dharma: há blogs e sites por ai que divulgam o Sanatana Dharma como se fosse um amontoado de baboseiras de crentes fanáticos e mimetistas irracionais. Cultivam algum tipo de seita ou religião comprometida com a hegemonia sem refletir, sem filosofia; repetem uma ideologia como a música do "tiririca".

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