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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Maya

Maya o que isso significa?

Swami Krsnapriyananda Saraswati


VAISNAVA BRASIL
GITA ASRAMA
2010


Radha-Krsna, amantes divinos

"O que impede minha presença no templo é maya, esta energia externa do Senhor; questões mundanas. Sinto que não devo juntar-me aos devotos e ser iniciada se não possuir o coração livre de todas as preocupações".


 “Om hari hara om. Abençoado Atma Imortal. Pranams. Sobre “maya”, o conceito Ocidental sobre isso é equívoco. Sinceramente, em nenhuma Escritura há o sentido de apego ou ilusão conforme se costuma atribuir no Ocidente a este termo. É bem verdadeiro o fato que a teologia védica é muito rica e abundante: muitos “deuses”, muitas formas, muitas maneiras de abordar o Supremo, seja manifesto ou imanifesto; muitas e muitas e muitas “religiões”, etc., ou seja, a “religião índica” é notavelmente rica e abundante, em contraste com as tradições judaico-cristãs, advinda do Meio Oriente, onde o terreno o qual foram cultivadas é árido, seco, pobre e sem perspectivas a não ser as escatológicas. De modo que a interpretação dada ao termo “maya”, ou mesmo “karma”, são senão incompletas ou então totalmente díspares do que realmente significam. O despojamento da cultura, do chamado ethos ocidental é mister para podermos compreender e vivenciar por completo a filosofia religiosa abundante e libertadora da Índia. A palavra “maya”, significa “de mim”, ou “por mim”, isso quer dizer que alguém tentar interpretar a complexidade do mundo a partir do seu próprio ego é o comum, a veia natural, das entidades vivas. Porém, nada mais do que isso. Vícios advindos de aculturamentos, como por exemplo o fato de os Ocidentais, no mais das vezes bélicos, conquistadores e opressores, não conseguiam entender a forma livre, sem repressão de nenhum tipo, das chamadas “religiões” do povo índio – um termo pejorativo que no seu cerne quer dizer “sem alma”, (indigenus= sem gêenio, antiga denominação de “alma”) porque criam os ocidentais (quase sempre sujos e mal cheirosos), ser uma “raça” ou “povo” abençoado que tinham alma, devido ao fato de crerem num “deus único”, o qual não ficou assim por muito tempo e tomou uma forma de trindade na Idade Média, sem no entanto alcançar o sentido que isso tem dentro do Sanatana Dharma. Mas o povo da Bharata, os habitantes do continente de Krsna, não são sem alma, porque nada é sem alma; e sim, eles são portadores do conhecimento que libera das amarras do mim mesmo, do “eu” e “meu” da identificação corporal ou maya (nada mais do que solipsismo e idiossincrasia). Isso é o que original e efetivamente significa. Maya significa identificação objetiva, primária, quase no nível da simples apreensão animal irracional. Os Vedas são tratados que retiram a condição de maya das pessoas. Alguém ter alguns desejos simples de manutenção, sem compreender que o corpo tem suas razões objetivas, e dizer que é maya, de fato somente é maya pela ignorância ou moha, como diz Sankara. Maya é a energia externa no sentido que é também do mesmo uno. Externo e interno são conceitos tão relativos e imperfeitos que não passam de ideias. O dentro e fora não resistem a simples quebra de um vaso. Portanto, separar o que é divino do que não é divino é, também, maya. O Senhor Krsna nos liberta de conceitos simples carregados em regras e regulações. A falsa moral, nascida na opressão de uns poucos sobre muitos é típico das religiões parcas, pobres em conteúdo e diversidade. Não na Índia védica. O mundo védico é um mundo de múltiplas ideias e abundâncias. Por isso, é bastante equívoco dizer que ter alguns desejos do mundo é maya. Mas maya é achar que alguém pode transcender o mundo simplesmente fechando seu coração para o mundo. O mundo material, a natureza material, suas múltiplas formas, nos mostram que o Senhor ou Senhora é rico, abundante e pleno de variedades. Maya nada mais é achar que o mundo é ruim ou danoso.

Mahavidya Cinnamasta - quem é mesmo quem desfruta?

Um estudo acadêmico do inicio da repressão dentro do sanatana dharma nos remete a Idade Media. A Idade Média foi alvo de grandes crimes praticados pelas pessoas da tradição judaico-crista contra a liberdade de agir e pensar de povos não ocidentais ou não convertidos. A Índia é um continente de “danados”, ou seja, de milhões de pessoas impedidas por séculos, ou milênios, de exercer e praticar livremente as suas formas de amar a Deus como bem entendem, sem regras e regulações da falsa moral Ocidental de proibições sem sentido; sem ter algum intermediário entre nós e Deus. Isso deixa chocado o Ocidental, no mais das vezes confuso entre o formalismo e a liberdade de expressar a fé. O Ocidente crê mais numa instituição no que na liberdade de amar ao Absoluto, na forma como bem entender da cada um. Por outro lado, isso deu influências em alguns grupos que mais ou menos misturam conceitos e culturas, dada a proximidade com a cultura inglesa na Índia na época do colonialismo. Isso é notável em grupos e seitas de fanáticos religiosos que vieram ao Ocidente em meados da década de 60, trazendo uma mistura mal formada de “hinduísmo” com tradição “judaico-cristã”. Deus passa a punir aqueles que se aproximam d’Ele. Que tolice, se assim fosse, porque Ele nos quereria junto a Ele? É claro que a tendência repressiva e acostumada a limites nascidos da visão dominadora de poucos sobre muitos, logo serviu de terreno fértil para o fogo de palha de tais seitas, que duraram até a morte do patrono, quase sempre milionário em poucas decadas, e em plena degeneração tão logo o patrimônio acumulado se esvaia, caindo em disputas internas ridículas. Ficam alguns poucos tolos disputando a tapas por bens materiais, caindo no vazio da ignorância objetiva, em completo moha, a achando que podem mudar o mundo por suas próprias forças, isso sim é maya!

Krsna é o libertador do formalismo. Ele está antes da Idade Média, mas as Suas palavras são atuais e muito cortantes: “deixe de lado quaisquer regras e regulações religiosas tolas, e simplesmente renda-se a Mim, Eu irei proteger contra qualquer reação, não temas” (Bgita, 18.66). Portanto, por que alguém insiste em religiões e regras e regulações que impedem a nossa livre maneira de amar a Deus? Por que temos que amar a Deus dentro de uma bula ou receita? Onde está dito que não podemos sentir, ver, tocar, e ter os sentidos sob nossa liberdade? Quantos se atreveram a dizer que Krsna é o Senhor do puro prazer sem limites, e cuja base está no Tantra? Por que alguém separa o tal “mundo espiritual” do “mundo material”, se tudo que o Senhor toca se santifica (assim é na prasada, etc)? Portanto, se Ele veio entre nós, Seus pés tocaram o mundo e o mundo se divinizou. Tolos pensam que o mundo é maya e transferem a liberdade de sentir, amar e viver a vida numa vida além da vida. Isso é degradante, sem sentido. Isso é uma forma de impedir alguém de viver a sua vida no seu tempo, lugar e circunstâncias. Como alguém todo-poderoso dota os Seus com recursos maravilhosos e depois diz: “não os deveis usar; isso é feio!”. Que tolice! Como alguém pode achar que pode ou deva limitar o Absoluto? Como uma mente relativa pode interferir na mente Absoluta? A repressão é típica dos tolos, porque antes de reprimir deveriam saber entender. Assim é com o amor e as relações. Tão logo alguém no mundo se associa com outro já há uma carga de limites que foram incorporadas e as quais tolhem a possibilidade de expressar o amor entre eles livremente. É como se alguém ao casar com outro transferisse um certificado de propriedade, atestando que irá privar-se de viver de ali para adiante. Que tolices! Jamais Krsna disse isso, pelo contrário, Ele nos disse “Eu sou o prazer dos amantes!”, portanto, como pode o prazer de alguém ser contrário a Krsna, o Absoluto? Tolos, simplesmente tolos são os que leem as palavras de Krsna como se Ele fosse o “deus punitivo”, pobre, sem abundância , tipico das religiões do Meio Oriente, onde a mulher, por exemplo, pode ser vista como inferior a um camelo. Krsna nos veio libertar da tirania da opressão do “eu” e “meu”, e nos abrir o caminho para o Seu amor sem limites.

Sri Krsnakali, subjugando a formalidade
Também é tolice achar que alguém vive fora de um templo. O Senhor Krsna diz no Bhagavad-gita que “Ele é o habitante no coração de todas as entidades vivas”. Portanto, se dentro de nosso coração está Krsna, como podemos ser diferentes de um templo? Ou admitimos que Krsna é Deus e Ele a tudo controla e onde vive é um templo, ou não. Se temos Krsna como a Suprema Personificação de Deus, então é certo que nosso corpo é puro, maravilhoso, esplêndido, a ponto de ter sido escolhido por Ele para ser o Seu habitat na Terra. Não está Deus apenas em templos de pedra, ainda que Ele seja onipresente, nem é a pedra seja superior ao nosso corpo. Quando alguém entende então que Deus é o habitante no interior de todos, a sua vida passa a ser divina. Os seus hábitos são divinizados. O promíscuo passa a ser superado pela compreensão do amor onisciente e onipresente do Supremo. Que lindo é o Senhor: amor puro e verdadeiro, sem religiões.

Sinceramente, ninguém vive a não ser em templo no mundo material. A alma sendo pura e perfeita não poderia habitar num lugar que não fosse adequado para ela. Não precisamos de igrejas, religiões ou quaisquer ambientes diferentes de nós mesmos para expressarmos o nosso amor a Deus. Nem mesmo precisamos de procuradores ou intermediários e intérpretes entre nossa fé e Deus. Somente Ele nos conhece em nossa intimidade, portanto, como pode Ele nos punir por aquilo mesmo que nos deu? Que bom que Deus não tem religião, e que possa morar livremente no coração de todos. Contudo, assim como alguém deve eventualmente trocar de roupas, porque elas ficam velhas e gastas, assim também este corpo tem seu tempo de uso e desgaste. É por isso que levar uma vida regulada pelas Escrituras é melhor. Krsna diz no gita que aqueles que trilham a vida segundo as Escrituras, não passam por dificuldades. Mas as Escrituras não contêm dogmas ou restrições e ou punições, e sim orientações, indicações; sugestões. Alguém pode ou não seguir, porque o livre arbítrio é pessoal.

O primeiro dos passos que alguém tem que dar para ingressar no Sanatana Dharma não é a mera iniciação, mas a compreensão de que somos mais do que nossos corpos divinos, somos sim almas eternas, divinas e perfeitas habitando um num corpo temporário, mas que também é perfeito na sua imperfeição. Este é o primeiro passo. O segundo é o livrar-se das religiões, porque o importante é o que fazemos para outros com a religião, e não a religião que temos. Foi isso que Krsna nos ensinou no Gita. Por que não conseguem ler isso?

Ser bom e fazer o bem é o que importa. Ver que todos são templos divinos é também uma forma correta de ver. E quem vive tendo a consciência que tudo e todos são tão somente o Supremo, irá compreender que não há “mundanidade” no sentido da falsa moral; essa tolice institucional que tem em vista arranjar fundos para manter alguém, em “nome de deus”, e que chamam de regras e regulações. De que adianta alguém ficar impedido de fazer algo, quando não compreendeu o que ele significa? Como dizia o filósofo Hegel, somente alcançamos a eticidade quando o em si e o para si se convertem uns sobre os outros, sendo superados e guardados. Que interessante isso! A verdadeira eticidade nos é ensinada por Krsna: faça tudo como uma oferenda para Mim; fique além do bem e do mal. Por que teimam em não compreender isso?



Que o Absoluto na Sua forma personificada do Senhor Krsna remova as amarras da ignorância que atam nossos olhos da Verdade Suprema!

Hari hara om tat Sat.

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