Escrituras
Hindus
Srī Swami Kṛṣṇaprīyānanda Saraswatī
prof. Olavo DeSimon
SOCIEDADE
INTERNACIONAL GITA DO BRASIL
SANATANA
DHARMA BRASIL
Gītā Āśrāma
Gītā Āśrāma
Porto
Alegre, RS
1997-2012
Sri Vyasadeva Maharishi |
1. Introdução
É um fato notável de que
não há uma religião sem seus escritos sagrados. Uma religião deve possuir um
corpo de doutrinas, bem como uma cosmologia, uma teodicéia, e todo um conjunto
de ensinamentos e filosofia que a tornam uma verdade possível. Também é bem
conhecido o fato que uma religião deverá possuir um conjunto de mitologia, sem
que esta expressão possua conotações inferiorizantes. Para o bem da Verdade,
uma religião sem estudo e sem filosofia trata-se de uma forma de fanatismo, da
mesma forma que uma filosofia sem religião é um modo de exibir a ignorância.
Não há religião sem filosofia, sem um corpo de textos que lhe dão a devida
sustentação. O Sanatana-dharma, na Sua própria definição de "conhecimento
religioso eterno" é uma viva expressão da Verdade Suprema na forma de
Escrituras.
2. Escolas de pensamento
Nós podemos destacar seis
principais escolas de pensamento que expressam o Sanatana-dharma, a saber: 1)
Nyaya; 2) Vaisheshika; 3) Sankhiya; 4) Yoga; 5) Purva-Mimamsa e 6) Vedanta. Uma
particularidade destas escolas é que cada uma delas possui um fundador: Nyaya é
atribuída a Buddha; Vaisheshika ao sábio Kanada; o Yoga a Patañjali; o
Purva-mimamsa a Jaimini, e, por fim, o Vedanta a Badarayana. Apesar de
defenderem pontos de vistas diferentes, estas escolas, decerto, abordam
questões semelhantes e triádicas, pois procuram analisar as relações existentes
entre o Brahman (Verdade absoluta; o Absoluto impessoal), a Jiva, (a alma) e a
Prakriti, (mundo material; a Natureza). Às vezes, as escolas Nyaya e Mimansa,
são as denominadas escolas heréticas, pois desqualificavam, de certo modo, os
textos védicos clássicos.
Vendo a grande diversidade
de pensamentos e de suas derivações, fica claro que o Hinduísmo é uma ampla e
quase infindável variedade de pensamentos, permitindo conter, inclusive, e
abrigar uma outra religião, como o caso do Budismo, que cresceu muito,
principalmente, fora do território da Índia, onde não é significativamente
expressivo o seu número de adeptos naquele país.
Para um praticante sério de
Yoga, os escritos sagrados são personificações da Verdade Suprema, do Senhor em
Si mesmo. O Vedanta, e todo o Seu conjunto de escrituras, contêm um vasto
número de livros, textos, poesias, Sutras, enfim, contêm o vasto universo
védico, numa tentativa de descrever as honras e glórias do Senhor Supremo. Como
diz Maharaj Krishnananda, "Toda a
nossa tentativa humana de entender a Deus sempre será uma tentativa",
ou seja, sempre será uma forma de darmos uma espécie de antropomorfismo para
Deus, segundo nossa própria imagem e semelhança. Por conseguinte, o estudo das
Escrituras védicas constitui todo um corpo doutrinário e filosófico, do mais
elevado nível. Na realidade, o desconhecimento ocidental, senão total da
filosofia dos Vedas, e dos seus seis Darshanas insubstituíveis na história do
pensamento humano, é algo imperdoável, e tem sido, sem nenhuma dúvida, um dos
maiores empecilhos para o desenvolvimento humano.
3. Corpo doutrinário
No Sanatana Dharma há um
conjunto de escrituras para um dos pilares sociais da vida. Artha, Kama, Dharma
e Moksha, por sua vez, originam todo um corpo de doutrinas que antecedem seus
nomes e ciências. Temos, assim, Arthashastras, que são escritos sobre o
desenvolvimento econômico; Kamashastras, que tratam do gozo dos sentidos; Dharmashastras,
que são os escritos das leis, e, por fim, os Mokshashastras, que se constituem
no corpo doutrinário da liberação material "par excelence". Isso
significa que o leitor terá todo um conjunto de textos para cada área que
desejar desenvolver nos seus estudos. Por outro lado, o correto desenvolvimento
e aprendizado das Escrituras deverá ser conduzido sob a orientação experiente
de uma pessoa versada nelas, chamado de Guru ou preceptor. Esta dedicação ao Guru
não se trata de nenhum fanatismo ou de uma perda de identidade, mas da correta
forma de encontrar-se e ter clareado os reiais propósitos da vida humana. Yoga
trata-se de um conjunto de ensinamentos e doutrinas que está muito além da
simples alienação mental ou psicológica de alguém. O Yoga é um conjunto prático
de vida que açambarca um universo inteiro de conteúdos e sentimentos, os quais
não podem ser transmitidos apenas por livros. A rendição ao Guru é mais do que
uma submissão pura e simples para alguém mais superior em conhecimeto, é uma
forma de entregar o coração e a alma para o preceptor que remove toda a escuridão
da ignorância na qual estamos mergulhados por absoluta vontade própria. Sendo
assim, nada mais acertado do que sairmos desta ignorância por nossa própria
vintade, sob a orientação segura e amorosa do Guru.
4. Divisões das Escrituras
As Escritura Hindus podem
ser divididas em dois grandes grupos, a saber, Shruti e Smriti. Academicamente
podemos dizer que as fontes autorizadas do Hinduísmo estão divididas nestas
classes: 1. Shruti e 2. Smriti. Onde, Shruti é considerada a autoridade principal,
e Smriti é a autoridade “secundária” dos textos sagrados.
5. Shruti, significa literalmente “aquilo que é ouvido”. Diz-se que
grandes Rishis (sábios) escutaram em meditação às verdades eternas da religião
e deixaram um relatório para o benefício dos outros. Estes relatórios são
chamados Vedas. Temos quatro Vedas a saber: o Rig-veda, o Yajur-veda, o
Sama-veda e o Atharvana-veda.
O Rig-veda é considerado um
dos mais antigos Veda, consiste em mais de 1.000 hinos, e, praticamente, todos
os outros Vedas baseiam-se nele. Contudo, grande parte dos aspectos conhecidos
nas “ciências védicas”, como as técnicas de meditação, mantras e yoga são ali
encontrados. É costume datá-lo em torno de 1.500 a .n.e., mas esta data
pode estar bastante equivocada, pois sabemos de descobertas arqueológicas anteriores
a ela, em pelo menos 5.000 anos, que relatam textos do Rig-veda.
No Sama-veda nós iremos
encontrar uma espécie de releitura do Rig-veda, pois contam os versos do
Rig-veda na forma de cânticos, representando, segundo a tradição védica, o
êxtase e a benção da chamada auto-realização. Faz-se comparações de que, “enquanto o Rig-veda é o passo, Sama-veda é a dança; o Rg-veda é a palavra, o
Sama-veda a compreensão”.
Já o Yajur-veda, o real
precursor de todos os outros Vedas, uma vez que todos estavam inicialmente reunidos
nele, dedica-se a purificação da mente e o “despertar” da consciência. De fato,
o Yajur-veda pretende unir, pelo processo de yoga - união -, o indivíduo com o
cosmos.
Por fim o Atharva-veda,
contém cânticos e processos mágicos visando acalentar os deuses e as forças da
natureza, com grande ênfase na arte da cura. Seus mantras visam afastar todo o
mal, os inimigos, as doenças, a má sorte e todas as espécies de interferências
positivas na vida. Este Veda é o único que contém rituais de magia e teurgia
utilizadas pelos sacerdotes. Muitos ensinamentos do Ayurveda (ayur = vida
quotidiana, e vid = conhecimento; ciência da vida quotidiana), tratado sobre a
saúde, saíram do Atharva-veda.
No Srimad-Bhagavatam,
1.4.16-25, encontramos o seguinte: “Certa vez, Vyasadeva, logo ao nascer do
Sol, tomou sua ablução matinal nas águas do rio Sarasvati e sentou-se sozinho
para concentrar-se. O grande sábio, viu anomalias nas funções do milênio. Isso
acontece na Terra em diferentes eras, devido a forças invisíveis, no decorrer
do tempo. O grande sábio, que estava plenamente equipado com conhecimento, pôde
ver, através de sua visão transcendental, a deterioração de tudo que é
material, devido à influência da era. Ele pôde ver, também que das pessoas
infiéis em geral teriam reduzida sua duração de vida e seriam impacientes,
devido à falta de bondade. Desse modo, ele procurou o bem-estar dos homem em
todas as ordens de vida [segundo o sistema de castas tradicionais da Índia].
Ele viu que os sacrifícios mencionados nos Vedas eram meios pelos quais as
ocupações das pessoas poderiam ser purificadas. E para simplificar o processo,
ele dividiu o único Veda [Yajur-veda] em quatro, a fim de expandi-los entre os
homens". As quatro divisões das fontes originais de conhecimento (os
Vedas) foram feitas separadamente. Mas os fatos históricos e histórias
autênticas mencionados nos Puranas são chamados de quinto Veda.
Após o Vedas serem
divididos em quatro partes, Paila Rishi tornou-se o professor do Rig-veda;
Jaimini, o professor do Sama-veda, e Vaishampayana sozinho obteve a glória de
Yajur-veda. Ao Sumantu Muni Angira, que era um Rishi muito devotado, foi
confiado o Atharva-veda. E Romaharshana, ficou encarregado dos Puranas
e dos registros históricos.
Todos estes acadêmicos
eruditos, por sua vez, transmitiram os Vedas que lhes foram confiados a seus
muitos discípulos, vem como aos discípulos de segunda a terceira gerações; e
assim surgiram os respectivos ramos dos seguidores dos Vedas. Dessa forma, o
grande sábio Vyasadeva, que é dito como sendo “muito bondoso para com as massas
ignorantes”, editou os Vedas para que eles pudessem ser assimilados pelos
homens da vida comum. Por compaixão, o grande sábio achou sensatamente que isso
iria capacitar os homens a atingirem o objetivo último da vida, a liberação.
Desse modo, ele compilou a grande narração histórica chama Mahabharata, para as
mulheres, trabalhadores e amigos dos duas vezes nascidos (Brahmanas).
Por sua vez, cada Veda
consiste de três partes: 1. Mantras ou hinos, 2. Brahmanas ou explicações dos
mantras e rituais e 3. Upanishads ou expressões místicas que revelam profundas
verdades espirituais. As mais importantes são os Upanishads. Formam as bases do
Hinduísmo. Os mais importantes Upanishads são: Kata, Kena, Katha, Prashna,
Mundaka, Mandukya, Aitareya, Candogya, Bahadaranyaka, Kaushitaki e
Svetashvatara. Estas são altamente autorizadas. Como aparecem no fim do Veda, o
ensinamento baseado neles é chamado Vedanta (teleologia (finalidade) védica). Algumas vezes o assunto exposto de
todo o Veda acha-se dividido em: 1. Karma-kanda, 2. Upasana-kanda e 3.
Jñana-kanda. O primeiro trata dos rituais, o segundo do culto ou meditação e o
terceiro do mais alto conhecimento”. Costuma-se dizer que os Upanishads contém
seis máximas ou Mahavakyas, “grandes ensinamentos”, sendo eles descritos a
seguir:
6. Os Upanishads e os Mahavakyas
Os Upanishads são um
conjunto de escrituras védicas, alguns em prosa, outros em verso, dos conhecimentos
fundamentais dos Vedas. É dito que os Upanishads são os textos teleológicos dos
Vedas, porque contêm em si a essência Vaidika-dharma. A complexidade dos Seus
assuntos requer que aquele que Os estuda tenha o supervisionamento de um mestre
experiente e realizado na Sua sabedoria. Assim como é dito que o Mantra Gayatri
é a essência dos Vedas, e o OM a essência dos Vedas e do Gayatri, Os Mahavakyas
(diz-se marra váquia) "ou grades ditos ou dizeres" são a essência dos
Upanishads. Estes Mahavakyas resumem o conteúdo de todos os Upanishads, sendo
que os 6 a
seguir são o néctar da essência dos Upanishads.
1. Aham Brahmasmi: “Eu sou
Brahma”. Estabelecendo a identidade entre o indivíduo e o chamado “Eu” supremo.
Dentro de cada um de nós há a presença Dele em nossos corações;
2. Ayam Ama Brahma: “O Eu é
eterno”. Havendo uma unidade entre o indivíduo e o Eu Absoluto, todos
perfazemos o Absoluto e Ele é eterno;
3. Tat tvam Asi: “Tu és
isto”. A mente é que nos conceda a ilusão do outro. Nós somos também os outros,
pois o conhecimento está em todos os lados. Eu me percebo nele, logo, “todos somos
isto”;
4. Prajñanam Brahma: “A
inteligência é Brahma”. De certo modo, esta afirmação está dizendo que a nossa
inteligência individual é a presença da inteligência divina em nós. Portanto , pelo
seu intermédio podemos conceber o Absoluto;
5. Sarvam Khalvidam Brahma:
“Todo o Universo é Brahman”. Portanto, tudo o que existe e que também não
existe forma o Eu Supremo, o Uno. Não há nada que é ou será que não seja Brahma;
6. So ham: “Eu sou Ele”. No
ato de respirar, nós dizemos o tempo todo o Absoluto.
Segundo Sarma, “A seguir,
em importância ao Shruti, está o Smriti, que coletivamente significa as escrituras
secundárias. Estas têm sua autoridade derivada do Shruti, pois sua finalidade consiste
em expandir e exemplificar os princípios do Veda. Consistem em: 1. Smritis ou
códigos de lei, 2. Itihasas ou épicos, 3. Puranas ou crônicas e lendas, 4.
Agamas ou manuais de culto e 5. Darshanas ou escolas de filosofia. Vejamos:
7. Smriti
Cada um destes itens está
distribuído em códigos ético-morais: os códigos mais importantes são o Manu, o
Yajñavaika e o Parashara, dando conta, digamos assim, do que cada um deveria
fazer segundo sua “classe social (varnashrama)”; Itihasas: estes são sem dúvida
alguma os livros mais lidos (sabidos de-cor) de toda a Índia Hindu. O
Mahabharata (grande Índia) e o Ramayana (epopéia de Rama), constituem os
grandes épicos védicos. O Bhagavad-Gita, um capítulo do Mahabharata, constitui
um livro a parte. Seus 700 versos contam a história de Arjuna e Krishna, diante
do campo de batalha de Kurushetra, onde também são descritos os quatro tipos de
yoga fundamentais: Karma-yoga, Dhyana-yoga, Jñana-yoga e Bhakti-yoga;, sendo que
Karma-Jñana-Bhakti é o conjunto perfeito da desvelação da Verdade Suprema.
8. Puranas
São considerados
“instrumentos de educação popular”, mas seguem os textos épicos importantes.
Mesmo assim, muitos dos Puranas contêm relatos históricos importantes. Nestes
textos, é freqüente o aparecimento de avataras e o relato de seus feitos. O
mais constante são as citações às dez encarnações principais de Vishnu, como:
Matsya (o Peixe), Kurma (a Tartaruga), Varaha (o Javali), Narasimha (o
Homem-leão), Vamana (a Anão), Parashurma (Rama com o machado), Ramacandra
(herói do Ramayana), Shri Krishna (o Bhagavan do Gita), Buddha (o fundador do
Budismo), Kalki (o herói que num cavalo branco irá aparecer no final da
Kali-yuga).
Se nós observarmos com
atenção, existe uma teleologia em cada um dos aparecimentos de Vishnu na forma
de um avatar. Matsya, por exemplo, possuía o objetivo de proteger e salvar o
“progenitor da raça humana”, Vaisvasvata Manu, diante de um dilúvio que punha
em risco toda a existência terrestre. Já a tartaruga Kurma, apareceu para
“recuperar algo de valor”, os Vedas e Manu, que havia sido perdido no dilúvio,
uma vez que os deuses e demônios tinham “revirado o Oceano de leite” procurando
por “estes princípios perdidos”, mas nada encontraram. Kurma ofereceu-se para
encontrá-los. A Terra, submersa nas água do dilúvio, tragada pelas atitudes
maléficas de um demônio denominado Hiranyaksha, é levantada por Varaha, o
Javali. O Homem-leão, Shri Nrishimhadeva, veio a este mundo com a finalidade de
libertar a Terra da tirania de Hyranyakashipu. Este poderoso demônio havia adquirido
alguns dons de Brahma, o criador do mundo, mas logo achou-se todo-poderoso,
pois realmente estava imune a deuses, homens e animais. O avatar anão, Vamana,
tinha como propósito “restabelecer o poder dos deuses”, que se encontravam
esquecidos do reinado de Deitya Bali. Parashurama veio ao mundo para libertá-lo
da tirania dos Kshatriyas, destruindo esta raça vinte e uma vezes. Rama, o
principal agente do Ramayana, teve como objetivo derrotar o tirano Ravana, o
conhecido “rei demônio de Lanka”. Krishna possui um triplo objetivo, uma vez
que seu aparecimento condiz com o início da Kali-yuga. O primeiro deles é
destruir os demônios, liderar a grande batalha de Kurushetra e trazer o mundo a
grande mensagem de Bhakti (protegendo seus devotos), no Bhagavad-Gita. Buddha,
por sua vez, é o fundador do Budismo, onde é frisado a proibição dos
sacrifícios dos animais, enfatizando também a sua vontade para com todas as
criaturas, para com todas as entidades vivas. Por fim, o décimo avatar em importância
é Kalki, que nos final da Kali-yuga virá para virá para destruir os demônios e
restabelecer a moral e a virtude, que estarão em completa decadência na mal de
governantes completamente desqualificados e demoníacos (veja mais sobre
Dasa-avatara).
9. Ágamas
Os Agamas podem ser
considerados uma classe de escritos populares. Entretanto, o uso deste termo
refere-se mais à forma como lidam os devotos com os cultos num aspectos
singular ou particular. No Hinduísmo, podemos destacar três grandes grupos
devocionais, os Sivaistas, que adoram Deus como Siva; os Vaishnavas, que adoram
Deus como Vishnu, e os Shaktistas ou tântricos, que adoram a Deus como Mãe do
Universo, sobre as diversas formas de Devi.
Escolas de filosofia ou
Darshanas, que na realidade são “pontos de vista” filosóficos, semelhante, por exemplo,
como acontece no Ocidente sob um mesmo aspecto metafísico. Dos seis pontos de
vista filosóficos, a saber: Nyaya (Buddha), Vaishesika (Kanada), Sankhya
(Kapila), Yoga (Patañjali), Mimamsa (Jaimini), Vedanta (Badarayana)],
permanecem como de maior importância o Vedanta.
Mahadeva (Siva) com fragmentos dos Āgamas |
Devemos, também, chamar a
atenção dos leitores para algumas interpretações ocidentais fruitivas dos
textos védicos, que fazem uma espécie de “polaridade” indevida entre o Sankhya
e o Vedanta. Os Vedanta-sutras, na realidade, são textos filosóficos védicos comentados.
E, obviamente, tanto o conhecimento do Sankhya como o Vedanta pertencem aos
Vedas, e estão de um modo outro contextualizados naqueles Escritos. Entretanto,
alguns autores dizem que o Sankhya é filosofia naturalista pura, dando,
evidentemente, uma ênfase às suas convicções particulares e materialistas, independente
dos Vedas. Mas, isso se deve pela existência de um monge chamado Kapila que
pertencia aos materialistas, mas não se trata de quem é citado no
Srimad-Bhagavatam; e, quanto ao restante, os chamados "espiritualistas",
segundo esta classificação não autorizada, estariam vinculados ao Vedanta.
Quando nós nos referimos a Kapila, com certeza, estamos nos referindo a Kapila
Muni, filho de Devahuti, e que aparece registrado no Srimad-Bhagavatam
(Bhagavata Purana). O Srimad-Bhagavatam é um dos documentos sagrados de grande
importância dentro do chamado “teísmo védico”, e que postula as bases
analíticas da Metafísica oriental, bem como qual é seu escopo e teleologia.
Kapila Muni, como
anteriormente dissemos, aparece no Srimad-Bhagavatam, precisamente no Terceiro
Canto, do Capítulo 25 ao 33. E, Este, definitivamente, é teísta e se trata, segundo
nós entendemos, pela literatura védica consagrada, do verdadeiro Kapila que instruiu
sobre o Sankhya.
O Sankhya, como vimos
acima, nos permite distinguir entre o físico e a matéria, na medida em que avança
nos aspectos metafísicos da existência, mas, convém salientar, faz também
afirmações a partir das “contingências do mundo material”, portanto, possui uma
espécie de cunho naturalista, mas não é naturalismo puro.
10. Os textos fundamentais do Hinduísmo e as escolas
Sri Kapila Munī |
Dentro do Hinduísmo nós
podemos destacar muitas escrituras, sendo que os Vedas são seus mais importantes
textos e lhe ocupam o topo na hierarquia de importância. A palavra “veda” pode
ser traduzida como “conhecimento”, ou “sabedoria”, e é possível que tenha
influenciado o latim com o vocábulo “veritas; veritatis”, que em português quer
dizer “verdade”. Os Vedas tradicionais são o Rig-veda, o Sama-veda, o
Yajur-veda e o Atharva-veda. A maioria dos Vedas possuem os hinos e os rituais
de sacrifícios religiosos dispostos de forma aprofundada. Em todos eles, porém,
nós encontramos três partes importantes, a saber:: Samhita, Brahmanas, e
Upanishads. Estas divisões têm a finalidade de atingir públicos diferentes, uma
vez que se entendia que nem todos possuíam a mesma capacidade de intelecção e de
compreensão dos textos védicos originais. Nós encontramos algo semelhante nos
textos filosóficos gregos de algumas escolas, onde existiam os chamados textos
ou escritos exotéricos, destinados ao público em geral, e os escritos
esotéricos, textos destinados somente para um seleto grupo de filósofos ou
pensadores. Neste sentido, os Upanishads são textos de difícil entendimento por
parte do grande público, e sua tradução literal significa “diante de”, ou seja,
eram comentários e textos obtidos frente a um mestre instrutor. Por outro lado,
muitos Samhitas e Puranas, a exemplo do Bhagavad-Gita e Srimad-Bhagavatam, fazem
parte dos ensinamentos para o público em geral. Já os Brahmanas são textos voltados para
os preceitos e rituais praticados pelos sacerdotes, que recebem seu nome, tendo
em vista o pré-requisito da compreensão e estudo aprofundado dos Vedas. Apesar
do Manusmriti parecer como um texto independente, e posterior aos Vedas, Manu é
citado nos textos védicos clássicos e originais. Por exemplo, lemos no Kanda I,
Prapathaka I, “Sacrifícios para Lua nova e cheia” nas orações preliminares do
Yajur-veda, mantra 2, o seguinte verso: “Vós
sois a substância do sacrifício. Os Rakshasas (demônios) são queimados por ele,
e os espíritos demoníacos são também queimados. Sois a causa Védica para os sacrifícios
de palha; feitos originalmente por Manu e adaptados pelos chamamentos de
Svadha”.
Os textos hindus mais
apreciados por todos são os Puranas, devido as suas características de contar
os chamados Lilas, ditos passatempos dos seus personagens, principalmente
Krishna e Siva. Nos Puranas nós temos muitos dos chamados mitos hindus, onde
seus personagens nos desvelam suas personalidades, sua vida cômica e trágica.
Nos Puranas está muito da cosmologia védica: de como o mundo iniciou; como teve
outros começos; batalhas entre semideuses e demônios, etc. Um dos mais famosos
Puranas é o Bhagavata-Purana, também conhecido como Shrimad-Bhagavatam; é uma
volumosa obra onde no seu Canto X é descrito a vida de uma encarnação de Vishnu,
conhecida como Krishna. Krishna é um dos principais mediadores na Batalha de
Kurukshetra, junto de Arjuna, seu primo. A parte do Mahabharata, no seu sexto
Canto, chamada de Bishma-parva, a saga de Bishma, o avô dos contendores, ficou
conhecido popularmente conhecida como Bhagavad-Gita, ou a “Canção do Senhor”.
Nesta batalha digladiaram-se membros de uma mesma família, dividida entre as
facções, os Pandavas e os Kauravas.
O Mahabharata e o Ramayana
são considerados as duas epopéias do Hinduísmo. No primeiro, como vimos, está a
mais espetacular das batalhas já ocorridas no mundo. No segundo, que é anterior
ao primeiro na sua realidade histórica, é contada a saga de Rama e sua consorte
Sita, que fôra raptada pelo demônio Ravana. No Ramayana aparece a figura de
Hanuman, o homem-macaco, que se tornou o principal apoio para a vitória de
Rama.
Uma parte do Mahabharata, o
Bhagavad-Gita, é uma importante obra de discussão filosófica onde aparece o
principal significado da natureza da existência, quais os desígnios dos homens,
e como devem agir para atingirem a perfeição. É sem dúvida uma das obras mais
publicadas no mundo, só ficando em segundo lugar com a Bíblia judaico-cristã.
Hari OM Tat
Sat