Hinduísmo
é Dharma,
Diferentemente de uma fé ou religião estagnadas
Tradução, comentários
e significados por
Swami Krishnapriyananda Saraswati
Prof. Olavo DeSimon
Sociedade
Internacional Gita do Brasil
Gita Ashrama
Primavera 2017
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Sábio instruindo sobre as Escrituras Védicas |
Prólogo
Ao contrário de
outras religiões, o Dharma hindu (equivocadamente chamado de “hinduísmo”), tem
muitas especialidades, as quais não são conhecidas como “religião”. O correto é
denominar o conjunto destas “especialidades” de Sanathana-Dharma (ordem
eterna). Conforme as escrituras (como o que vemos no Bhagavad-gita), o dharma
eterno não pode ser destruído pelo fogo, água, ar, ou armas, e está presente em
todo o ser, seja vivo ou não-vivo. Entre outros tantos sentidos e significados,
“dharma” remete-nos a “caminho de vida”, o qual está exemplificado em todos os Acharas,
ou seja, costumes e rituais védicos conforme o dharma.
Se podemos
falar numa “espiritualidade científica”, eis aí o Sanathana-dharma. Através de
toda a literatura clássica da Índia Hindu, podemos ver que a ciência e a
espiritualidade estão integradas, sendo mesmo inseparáveis uma da outra. Por
exemplo, no Yajurveda, no Upanishad conhecido como “Ishavasya”, são dados
exemplos de conhecimento científico (empírico formal), para resolver os
problemas em nossa vida, e é feito uso do conhecimento espiritual, tendo em vista
liberar do ciclo material, assim, alcançando a imortalidade, por meio das
perspectivas filosóficas.
Do conceito “sanathana-dharma”
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Jagannatha (no centro), Baaladeva (em cima), e Subhadra - trimurti védica. |
Sanathana-dharma
não é algo que possa ser definido facilmente, não pertencendo ou tampouco
estando numa determinada doutrina dogmática estagnada, e sequer num livro ou
escritura única em particular. Compreenda que,
diversidade e diferença de opiniões ou expressões, são os exatos ornamentos
refulgentes do Sanathana-dharma. Por conseguinte, podemos encontrar diferentes
tipos de doutrinas no seu cerne, conforme alguns aspectos que comentamos
abaixo:
a) Advaita
Vedanta: neste conceito, há total unidade entre tudo e todos. Qualquer
entidade que é finita, temporal ou, então, que possa ser definida usando
atributos (saguna), é tratada como irreal (maya), e o espírito (atma), é
o pressuposto da única entidade real. O atma é o menos atributo, sendo
infinito, por definição. De outra forma, tudo que é irreal, finito, temporário
e ilusório, é maya;
b) Dvaita
Vedanta: nesta visão, a realidade é classificada sob três aspectos ou
partes, cada uma sendo diferente da outra: entidades sensíveis; entidades
insensíveis e deus, ou entidade suprema. Cada um destes aspectos é considerado
real, enquanto que alguns podem ser temporários e outros eternos, mas mesmo
assim, são reais, na visão dvaita;
c) Vishishtadvaita
Vedanta: a expressão que melhor caracteriza esta visão filosófica é dita: “Deus
é o habitante do meu coração; eu adoro Saguna-Brahman (deus com atributos), que
permeia a tudo como espirito. Brahman, embora independente e absoluto, é o todo
(criação inclusive). Eu sou espirito/alma, cuja existência é dependente do
espírito universal”.
Escolas conforme o humor da triguna da prakriti e
antagonismos com a visão ocidental
Podemos
enumerar três escolas fundamentais que seguem um ou outro modo filosófico
apontado acima. Conforme as três divisões da natureza temos, Shivaismo,
Shaktismo e Vaishnavismo. Há outros, mas aqui reduzimos para facilitar o
estudo. Salientamos, contudo, que todos estes estão ligados uns aos outros, mas
cada um tem uma filosofia independente e distinta.
Na ciência da
atualidade, vemos uma estrutura semelhante. Qualquer um que tenha estudado ciências
na escola compreende a comparação entre mecânica newtoniana, lagrangiana,
hamiltoniana e quântica.
De modo
semelhante, podemos ver as “camadas estruturais” semelhantes da percepção na
cosmologia do Universo Brahmananda (universo de óvulos cósmicos); Universo
Aristotélico, Universo Heliocêntrico de Copérnico, Universo Abramático,
Universo Newtoniano, Universo Einsteiniano, Modelo Big Bang do Universo,
Universo Oscilante, Universo Estadual Permanente, Universo Inflacionário (ou
inflando, em expansão) Multiuniverso, e assim por diante.
Por isso, é possível
afirmar que o que chamamos de “hinduísmo” não se trata de uma única fé. Trata-se
de um conjunto universal de conhecimentos racionais e intuitivos, os quais não
podem ser definidos singularmente, devendo ser vividos e experimentados. Eis
que fica compreensível que os chamados, “mal” e o “erro”, não são definidos em
termos maniqueístas, portanto, não há inferno, pois, afirmar este, significaria
afirmar um local onde o Absoluto ou deus não é (portanto, O nega), bem como que
há pecados superiores ao amor.
Escrituras sagradas
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Veda-Vyasa, compilando os textos Acharas |
Entre os nomes
das principais escrituras do Sanathana-Dharma, destacam-se, os Vedas,
Upanishads (textos comentados daqueles), Brahmanas, Puranas, Gitas, Bhagwats,
Sutras, Shastras, os quais, em conjunto, elevam o vasto conceito, assim como
pilares do conhecimento, onde cada um têm sua própria importância em seus
setores. Alguns textos, falam sobre a ciência da criação, a biodiversidade;
alguns dizem sobre filosofia de vida, outros, sobre arquitetura, engenharia,
medicina, incluindo artes como cirurgia, yoga, meditação, ética, astronomia,
astrologia, percepções futuras, psicologia, dança, música, artes, economia,
história, e muitos outros assuntos. Esse conjunto de textos, escrituras, e
assuntos, é chamado Sanathana-dharma, sendo que “dharma” tem um sentido direto
de “virtude”, Ética e Moralidade, as quais apontam para Propriedades, Regulação,
Devoção, Sigilo, Princípios Gerais de Justiça, Honestidade, Dever, Atribuições,
Piedade, Sacralidade, mas mesmo assim, não se trata de religião.
Aspectos conclusivos
Devemos lembrar
que em cada Achara (costume e ritual considerado védico), haverá um componente
de espiritualidade nele. Sem espiritualidade, nada existe no Sanathana-dharma. Via
de regra, é costume dar uma interpretação equivocada que este espiritualidade é
religião. Salienta-se que a espiritualidade é diferente no Dharma védico,
chamado “hindu”. Neste, a questão da religião não existe, uma vez que o Dharma
não foi criado por um indivíduo, um profeta ou qualquer que seja encarnação.
Eis que, a espiritualidade é uma parte de todo o costume hindu na vida normal
de um hindu.
Acharas (os
costumes védicos e rituais), dever ser seguidos com base nos méritos
disponíveis, a partir da auto-experiência. Portanto, ao contrário das chamadas
religiões organizadas, tendo estes um fundador, não é necessário seguir
cegamente a um instrutor ou alguém que lhe imponha conselhos ou ideias sem
reflexão e raciocínio. Aliás, este aspecto de alienação do indivíduo é típico
de religiões, não cabendo no Sanathana-dharma. Todos os Acharas são indicados
para a prosperidade dos seres humanos, devendo ser este o principal foro na sua
prática, afastando-se rituais que buscam apenas alcançar felicidade puramente
material, porque o conceito de liberação ou mukti está acima de qualquer coisa.
“Acharyah padam
adatthe padam
Sishya swamedhaya
padam a
Bramacharibhya sesham
kala kramena ca”
Este verso
contém o conselho dos smritis (textos comentados por um mestre), no qual
está dito que uma pessoa só pode obter ¼ do conhecimento de um Acharya
(mestre), outro ¼ analisando a si mesmo; outro ¼ discutindo um conceito com
outros, e, por fim, o ¼ restante, deverá ser alcançado durante o processo da
vida, por adição, eliminação, correção e modificação de um achara conhecido, e
por novos acharas que são experimentados.
“Acharath labhathe ovayu
acharatah dhanamakshayam acharatah labhathe supraja
acharatah dhanamakshayam acharatah labhathe supraja
Acharo ahanthya
lakshanam”
“Acharas são
seguidos para a saúde fisiológica, psicológica e longa vida; Acharas são
seguidas para a prosperidade e riqueza; Acharas são seguidas para uma família e
sociedade fortes; seguir os Acharas alcança-se uma fina personalidade, visão
dharmica (reta visão)”, assim diz o Dharmashastra.
Na Índia dos
hindus, os Acharas (costumes védicos) são seguidos tendo em vista benefícios psicológicos,
físicos, familiares, sociais, bem como benefícios baseados na integração
Nacional, conforme mencionados acima.
Portanto, é
dever de um Vaidhika-Dharmi (seguidores do Sanathana-dharma), compreender
cientificamente, racionalmente e logicamente o significado de cada Achara,
seguindo-o de forma sistemática, aprimorando a cada tempo, evoluindo para a
liberação do ciclo do Samsara.
Hari
om tat sat
Achara comunitário na Índia: Ganga-puja
Achara comunitário na Índia: Ganga-puja